quinta-feira, 15 de novembro de 2012

Clown time: A hora do palhaço (Sônia Pillon)

As arquibancadas estavam lotadas.

Especialmente pelas crianças, que se agitavam,

olhos brilhantes e sorrisos de expectativas.

Estavam acompanhadas dos pais, irmãos e

coleguinhas de escola. Algumas seguravam balões

coloridos, outras pacotes de pipoca, que comiam

avidamente, com os olhos fixos no picadeiro.

E pouco importava se parte da grande lona do

circo estava remendada e com goteiras em alguns

pontos. Eles estavam ali para assistir o palhaço,

com sua roupa espalhafatosa e desajeitada, sua

maquiagem engraçada e suas tiradas ingênuas.

Mas não eram só os pequenos que se

encantavam com as palhaçadas desse artista

de tradição milenar. Os adultos, também! Eles

voltavam à infância, ao tempo em que andavam

descalços pelas ruas e jogavam ‘pelada’ no

campinho do bairro... “Bons tempos, aqueles!”,

pensavam, num instante de nostalgia... As

obrigações do dia a dia de gente grande os levou

para caminhos nem sempre coloridos, cinzentos,

muitas vezes...


José olha para o filho João e reconhece nele

mesmo brilho no olhar de quando era moleque,

quando e o circo chegava na cidade. Na época,

era um verdadeiro acontecimento! Hoje, em

muitos momentos, a vida lhe pareceu um circo

de horrores... Mas também lembrou de uma

frase do ator brasileiro especializado na arte

de fazer sorrir, Nico Serrano, de que ‎"a alegria

de palhaço não é ver o circo pegar fogo. É ver a

alegria incendiar o picadeiro”... Pura verdade!

A música começa a tocar e o espetáculo

está prestes a iniciar. “Respeitável público!

Senhores, senhoras, senhoritas, gente pequena

e gente grande! Temos a honra de apresentar o

palhaço ‘Tagarela’, o maior mímico do Brasil!

Palmas para ele!”... A criançada entra em delírio.

Todas as atenções se voltam para o Tagarela,

que fala pelas mãos, expressões do rosto e

pelos movimentos do corpo. As palhaçadas e

trapalhadas do Tagarela arrancam gargalhadas

da plateia, que se torce de tanto rir. Sucesso

absoluto!

A apresentação do palhaço chega ao fim

e o público o aplaude de pé. Ele se despede,

sem dar as costas para a plateia e se recolhe

ao fundo do palco. Agora Tagarela está no

camarim, senta em frente ao espelho e olha

para si mesmo. Tira o nariz de palhaço e

começa a remover a maquiagem. Estava feliz. O

entusiasmo do público compensava as tristezas,


a solidão, as dívidas acumuladas, a incerteza

do futuro... “Tudo vale a pena!”, disse para si

mesmo, enquanto uma lágrima escorre pelo seu

rosto...




Sônia Pillon é jornalista e escritora, nascida em Porto Alegre (RS) e desde 1996 radicada em Jaraguá do Sul (SC).

3 comentários:

  1. Como professor me vejo nesse personagem:
    "Estava feliz. O
    entusiasmo do público compensava as tristezas,
    a solidão, as dívidas acumuladas, a incerteza
    do futuro…"

    A cada dia é mais ou menos assim que me sinto. Aliás preciso me sentir. Do contrário a gente desanima...

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  2. Lindo, Sônia! No palco e nos bastidores: O palhaço.
    O Público na arquibancada e fora dela. A vida. o circo!!!
    Adorei :)

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  3. Entendo bem esse sentimento de um professor, Tiago, e imagino que você seja bem dedicado à profissão! :) Também já tive a satisfação de sentir o mesmo em sala de aula, na breve passagem que tive nessa área. O entusiasmo e o aprendizado dos alunos compensa tudo o mais...

    Poética, agradecida! :) Sim, é exatamente isso! Quem de nós já não se sentiu um palhaço nesse picadeiro que é a vida, enfrentando o público na arquibancada?... :)

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